quarta-feira, junho 13, 2018

Automação robótica de equipamento de observação astronómica: um caso IoT




Em 2018 a aquisição de uma montagem equatorial alemã iOptron CEM60 dotada de um Hub USB com fornecimento de energia 12volts fez-me pensar em automatizar a sua operação bem como todos os dispositivos conectados à mesma, nomeadamente as camaras CMOS/CCD de aquisição de imagens e de guiagem, assim como o sistema de focagem e um simulador do céu/planetário tipo SkySafari ou o Kstars.

  
  
A montagem e o tripé (antes e depois)

Surgiram na altura duas ofertas no mercado, com características de grande portabilidade e de crescimento modular e ainda de baixo custo. Uma de origem koweitiana (designada por StellarMate IoT), outra de iniciativa francesa (AstroPiBox) tinham por base a placa Rasberry Pi 3, que entretanto ganhava popularidade e se expandia em aplicações de toda a ordem, chegando a Estação Espacial Internacional a estar dotada de dois RB Pi para software concebido pelas escolas.



A nossa opção centrou-se no IoT (Internet of Things) StellarMate dado apresentar-se com integração de meios e software (firmware) nomeadamente o conjunto Kstars/Ekos/INDI sob qualquer plataforma Windows/Linux/OSX/Android.



Kstars é um simulador do céu, tipo planetário, com origem na iniciativa KDE-edu enquanto o Ekos constitui um ambiente de controlo integrado que permite a gestão de um conjunto de operações desde a aquisição de imagens e de guiagem até ao controlo de qualquer dispositivo de utilização astronómica (camaras cmos/ccd, rodas de filtros, sistemas de focagem, montagens, desembaciadores, Flip-Flat, espetrógrafos, óticas adaptativas, estações meteo, GPS, observatórios, astrometria de precisão, alinhamento polar, operação robótica à distância, etc).
INDI constitui a coluna vertebral de todo o sistema porque é um servidor que assegura a comunicação kstars/Ekos com os “drives” de todos os periféricos em simultâneo.
O RB Pi3 da StellarMate inclui já um micro-cartão SD de 16GB de classe 10 com todo o software. Acionámo-lo a partir de um Tablet Android ASUS de 10 polegadas e configurámos o StellarMate e a iOptron CEM60 com toda a cablagem USB, redutores de voltagem e amperagem e ainda adaptadores porta-série RJ4/DB9/USB necessários para a sua operação eficaz.
Quisemos dotar a montagem iOptron CEM60, possuidora de um sistema inovador de balanceamento denominado  “Center Balanced Equatorial Mount”, com a possibilidade de alternar com a instalação de diversas óticas como um Celestron 203mm ou uma Takahashi 102FS ou ainda um refrator 66/400. Para tal tivemos que aplicar na montagem um suporte que acondicionasse o StellarMate bem como outro equipamento que descreveremos mais adiante.

Sistema mecânico de suporte ao Rasberry Pi3 e redutores de voltagem



Esquema geral definitivo do fluxo de dados e dos circuitos elétricos (com o C8 como ótica)



Como equipamento de aquisição de imagens tínhamos a velha Canon 350D desfiltrada, com sensor CMOS de resolução 3464 x 2309 píxeis e 6,41 microns de pixel pitch, e, à qual foi necessário adaptar um cabo a ligar a bateria de lítio a um redutor de 12 volts fornecidos pelo painel DEC da montagem iOptron convertendo-os para 7,6 volts e 2 amperes através de duas fichas macho/fêmea de 5,5/2,1. Usando solda e ferro de soldar e depois de identificadas a polaridade dos fios foi fácil conceber esta ligação. Tivemos a preocupação de arranjarmos um redutor de voltagem que se situasse entre os 7 e 8 volts e fornecesse os 2 amperes para não “fritar” a bateria da Canon.
A Astrolink 4 Mini possuía um redutor deste género devidamente protegido e destinado a camaras DSLR.
 

A Canon 350D agregada a um OAG juntamente com a ZWO ASI224mc como camara de guiagem

Da Canon 350D fizemos uma ligação ao DSUSB da Shoestring com a Canon em Bulb e M Mode (cabo coaxial com jacks machos respetivamente de 3,5mm/2.5mm tipo E3), ligando depois diretamente o gadget DSUSB através do seu próprio cabo USB 2.0 ao painel DEC da iOptron. 
Para tranferência de imagens ainda tivemos que ligar a micro USB da Canon a outra porta USB do Painel DEC da iOptron (ver esquema).
Na plataforma INDI introduzimos a definição DSUSB na porta de comunicação.



Esquema de suporte da DSUSB à Canon 350D

Experimentámos o QuickRemote desenhado por Christian Buil sem sucesso, enquanto o interface usb-eos para exposições longas (acima de 30 segundos) comercializado pela PierreAstro funcionava perfeitamente com a adição de mais um cabo USB entre a Canon e o DEC da iOptron para transmissão das imagens.

No painel polar da iOptron CEM60 fazíamos sair um cabo USB B/ USB A ligando ao StellarMate fazendo assim a comunicação de dados entre os dois. Ainda ao painel polar fornecíamos energia 12 volts 6 amperes com um transformador.



A camara de guiagem ZWO ASI224mc montada num OAG (Off-Axis-Guider) ligava diretamente a sua porta ST4 à porta “Guide” na própria montagem, enquanto o cabo USB B da ASI ligava a uma porta USB do painel DEC da iOptron CEM60.


  
  




No StellarMate ligavam diretamente os cabos USB A do motor de focagem, USB_Focus_V3, e da própria montagem iOptron com cabos adaptadores RS232/RJ4/DB9/USB A, dado que tanto a montagem como o focador tinham fornecimento de energia independentes não sobrecarregando o StellarMate. Ao StellarMate era fornecida energia 5V 2,5 amperes a partir dos 12 volts do painel DEC da iOptron através de um redutor de voltagem e com cabo micro-USB.



    

Aspeto das ligações ao StellarMate e ligação RJ4/DB9/USB da montagem iOptron


Aspeto do painel DEC da iOptron com saídas para a Canon, ZWO, voltagens para Canon e StellarMate


Ao sistema de focagem USB_Focus_V3 adaptámos um conjunto de placas metálicas adquiridas na AKI e que, com alguns parafusos e anilhas de aperto, dispúnhamo-lo de forma apropriada a permitir ao motor poder fazer a focagem sem stress mecânico.




Sistema de focagem instalado permanentemente no DEC da ioptron permitindo alternar com diferentes óticas.



Em termos de potência elétrica instalada, tivemos o cuidado de ter um conjunto devidamente balanceado de modo a que tanto o fluxo de dados como as amperagens estivessem distribuídas devidamente e não causassem obstáculos operacionais:

iOptron paínel polar – 12V 5Amp / Transformador – 12V 6Amp
USB_Focus_V3 – 8V 1,5Amp com o seu transformador próprio
StellarMate – 5V 2,5Amp / Redutor Voltagem – 5V 3Amp
Canon 350D – 7 a 8V 2Amp / Astrolink 4 Mini – 7,6V 3 a 4Amp
ZWO ASI224mc – 5V 1,5Amp



Reguladores de voltagem para a Canon350D e para o StellarMate


  
 

Tranformadores para o painel polar da iOptron e montagem iOptron CEM60 e ainda para o sistema de focagem USB_Focus_V3



Resolução de problemas adicionais de facilitação operacional do sistema:

Adaptação de uma pesada “dolly” de modo a encurtá-la para poder andar nos corredores de acesso ao exterior e balanceamento do contra-peso dado que com a instalação das camaras, do sistema de focagem e de um TelRad o eixo AR ficava ligeiramente desequilibrado a oeste. Inventámos um contra-peso adicional instalado no próprio contrapeso da montagem iOptron aproveitando uma rosca existente.
Criámos também um dispositivo para produção de Flats convertendo um monitor de computador e ainda instalámos uma camara robótica para monitorização da operação da montagem bem como um monitor de voltagem.


Adaptação da “dolly”


Contra-peso adicional


Dispositivo para Flats

  

Camara robótica WiFi e imagem produzida pela mesma



Monitor de voltagem do StellarMate




Kstars/Ekos/INDI – a coluna vertebral


INDI Web Manager mostrando a atribuição definitiva de portas-série de comunicação RS232 para a montagem iOptron CEM60 e para o USB_Focus_V3 (este ultimo foi retirado depois porque não era preciso)



Alguns parâmetros de controlo Ekos da montagem



Autoguiagem com o Ekos com alinhamento polar e correção apenas a duas estrelas



A aquisição de imagens com a Canon 350D (Nebulosa do Haltere)



SkySafari controlando a montagem e mostrando o FOV do sensor cmos





As configurações óticas C8 f/6.3 e doTakahashi 102FS f/8




As resoluções obtidas em segundos de arco por pixel para as duas óticas com OAG.
Os sensores CMOS da Canon 350D e da ZWO ASI224mc permitem obter valores rácio idênticos de 1:0,59




 

Os dois sistemas em funcionamento na mesma montagem equatorial alemã



Em conclusão:

A utilização integrada de um simulador do céu (Kstars) a partir do qual se tem acesso ao controlo automatizado de todos os dispositivos numa única página como o faz o Ekos, utilizando a “INDI Library” através do ubuntu 15.10, constitui um bem precioso e inestimável que se reflete na operacionalidade simples e amplamente portátil do conjunto com um Tablet/Smartphone via rede WiFi ou pela criação de um Hotspot pelo próprio Rasberry Pi 3 (neste caso comercialmente designado StellarMate). O seu valor acresce ao estar dotado também com um cartão micro SD com 16GB que permite guardar as imagens adquiridas para posterior processamento ou já com o pré-processamento feito ou permitindo a utilização de outros simuladores do céu como o SkySafari ou o Stellarium  (referidos como dispositivos Auxiliares pelo Ekos).

 



Controlo via WiFi da rede local todo o equipamento com um portátil Lenovo em ambiente Windows 10 depois de estabelecida ligação com o Stellar Mate alojado num Tablet android em ambiente linux/ubuntu.

Indi Library possui um Forum de apoio aos utentes e atualizações frequentes abarcando cada vez mais dispositivos a controlar. Jasem Mutlaq é o seu mentor e obreiro principal.




Outras expansões possíveis

A instalação de um outro IoT, denominado AstroLink 4.0 Mini permite ainda adicionar outros dispositivos como cintas desembaciadoras ou mesmo abdicar do transformador do focador USB_Focus_V3 abastecendo-o dos 8 volts necessários ao seu funcionamento através de uma saída de voltagem regulável.
O software do AstroLink 4.0 Mini permite parametrizar e gerir as saídas de voltagem tornando-as permanentes bem como ainda controlar motores de passo.

  



Como utilizador INDI (@fonsecaporto) quero deixar aqui um agradecimento caloroso ao sempre disponível Jasem Mutlaq, gestor da INDI Library, lançador do IoT StellarMate e astrónomo amador conhecedor das dificuldades práticas com as quais se defrontam diariamente todos os astrónomos amadores. Devo-lhe o seu esclarecimento pertinente a situações mais obscuras de algumas configurações. Também a ele se deve o seu empenho na atualização permanente e constante de todo o firmware




Imagem do twitter do Jasem Mutlaq com fotos do sistema



Nebulosa do anel: integração 11x300s, C8 f/6,3, Canon 350D 1600iso



Messier 27 a nebulosa do Haltere. Exposição de 30 minutos com guiagem feita com ASI224mc e ZWO off-axis-guide. Imagens adquiridas por Canon 350D com montagem equatorial iOptron CEM60 e Plataforma Ekos/INDI. Refrator Takahashi 102fs a f/8. Controlo WiFi com Skysafari.
Condições meteo razoaveis com muita poluição luminosa de uma arraial do Espírito Santo local




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